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Juro Alto Envenena Nota
de Risco
Valor Econômico, 29.11.2001,
por Sergio
Leo, Brasilia
A ação do
próprio governo vem mantendo a taxa de juros muito acima do que seria necessário para
compensar o "verdadeiro risco Brasil". As taxas se mantém altas porque é a
política monetária do governo que influencia negativamente as expectativas do mercado.
Essa é a tese do trabalho "Uma estratégia de desenvolvimento com
estabilidade", título ainda provisório de um estudo inédito dos economistas Luis
Carlos Bresser-Pereira e Yoshiaki Nakano, que trata da influência negativa da política
monetária sobre o risco do país.
"Essa taxa de
juros altíssima no país contamina o risco-Brasil", avalia Bresser-Pereira. Uma
tabela montada com 24 países pelos dois economistas mostra que as taxas reais de juros,
descontadas a inflação e a variação cambial, não têm mantido correlação com as
notas de risco dos países, conferidas por agências de classificação de crédito como a
Standard & Poor's.
Usando taxas de juros reais calculadas pela unidade econômica
da publicação inglesa "The Economist" e a tabela de classificação de risco
da Standar & Poor's, Bresser e Nakano mostram que o Brasil, com risco classificado
como "BB-" , tem uma taxa real fixada pelo Banco Central em torno de 10,95% ao
ano, mais do que o dobro da taxa da Rússia, que fez moratória da dívida há três anos
e é classificada com nota de risco "B", um nível abaixo na tabela da S&P.
A taxa russa é de 4,08% ao ano.
A disparidade entre taxas de juros e classificação de risco
não é exclusividade de Brasil e Rússia. Um país BBB+, como a Polônia, tem taxa real
de 8,99%, enquanto o México, três níveis abaixo segundo a S&P, tem uma taxa de
apenas 0,87%. O Peru, com a mesma classificação do Brasil, tem juros reais de 4,1% ao
ano.
Além do efeito evidente da taxa de juros sobre o crescimento
da dívida pública, o Banco Central, ao mantê-la em patamares excessivos, sinaliza aos
mercados a desconfiança da própria autoridade monetária em relação à estabilidade do
país. "Falando em termos bem populares, o que passa na cabeça dos operadores de
mercado é: se os próprios brasileiros consideram o risco tão alto a ponto de fixar
taxas nessa altura, devem saber algo que não sabemos", simplifica Bresser.
Bresser e Nakano baseiam-se em um modelo de livro-texto - mais
exatamente, o livro Advanced Macroeconomy, do professor David Romer -, para mostrar que
há mais de um ponto possível de equilíbrio para as taxas de juros, no caso brasileiro.
"Os juros no Brasil estão em um ponto de equilíbrio perverso", garante
Bresser-Pereira.
"Existe um ponto de equilíbrio para as taxas muito mais
baixo, que é o equilíbrio dos países civilizados", argumenta Bresser,
esquivando-se de definir qual seria a taxa equilibrada para a situação atual do país.
"Posso dizer que é uma loucura completa a taxa real no Brasil ficar muito acima de
2% a 3% dos juros europeus ou americanos."
Embora creia que há espaço para se baixar a taxa de juros,
Bresser elogia a gestão de Armínio Fraga que, segundo acredita, "merece grande
crédito, porque foi baixando as taxas firmemente, corajosamente, até que chegou a crise
argentina". O mercado sempre se dizia surpreendido a cada queda nos juros, lembra o
ex-ministro da Fazenda. "O problema é que o mercado brasileiro está viciado nessas
taxas mais altas", comenta.
Bresser nota que, em países como os Estados Unidos e França,
um aumento de taxas cria problemas para os bancos, que captam a curto prazo e emprestam a
longo prazo. No Brasil, os bancos são credores principalmente do governo, e ganham a cada
elevação dos juros.
Bresser e Nakano argumentam que, embora oficialmente a taxa
brasileira tenha o único objetivo de assegurar o cumprimento das metas de inflação, os
juros têm exercido no país uma quantidade excessiva de funções na política
econômica. "Os juros tem sido usados para reduzir a demanda agregada, para conter o
consumo e a inflação, para evitar uma grande desvalorização da taxa de câmbio, para
induzir o investidor externo a comprar títulos públicos", lista Bresser-Pereira.
"Isso faz com que as autoridades ajam contrariamente ao interesse do país."
O estudo que os economistas pretendem divulgar em breve foi
uma iniciativa de Nakano, após a leitura de um artigo de Bresser-Pereira para a
publicação "Valor 1000", em que o ex-ministro defendia a necessidade de
medidas para estimular a acumulação de poupança interna, indispensável para a retomada
de investimentos e do crescimento. "Temos que discutir a taxa de juros", propôs
Nakano. "É uma tolice continuar lembrando a moratória brasileira, 15 anos depois,
como argumento para manter os juros nas alturas", critica Bresser.
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